domingo, 12 de agosto de 2012

Telefone Com Fio


O genuíno tédio flutuava vigoroso ao redor de Anete. Ela não tinha absolutamente nada para fazer. As aulas já haviam acabado, estava de férias do trabalho e os pais não se encontravam em casa, faziam a compra do mês. Provavelmente demorariam e, até lá, ficaria sem ter com quem conversar.
   Já resignada com a mórbida tarde que se estendia cruelmente a sua frente, dirigiu-se ao quarto, roendo – freneticamente – a unha do polegar direito em gesto de extrema ansiedade.
   Foi então que algo aconteceu: dizendo-lhe, usa-me, estava o telefone, acomodado jeitosamente ao lado de uma agenda – infinitas possibilidades – sobre o criado-mudo.
   Anete sorriu e rapidamente telefonou à Janete.
_ Alô? – atendeu a amiga. 
_ Olá, Janete! Aqui é Anete.
_ Como vai, querida?
_ Muito bem e você?
   Após 45 minutos de conversas triviais, como quem não quer nada, Anete comentou:
_ Ontem, de minha janela, eu a vi, a avó da Ana. Qual não foi minha surpresa! Estava lindíssima entrando em um carro sofisticado.
_ E você viu quem o dirigia?
_ Não. Os vidros eram escuros...
_ Vai saber! Preciso desligar agora. Tenho que limpar a casa.

_ Alô?
_ Olá, Margarete! Aqui é Janete.
_ Como vai, querida?
_ Muito bem e você?
   ...
   ...
   ...
_ Menina! – exclamou Janete eufórica. – Esqueci de lhe contar: a avó de Ana foi vista entrando em um carro de luxo. Dizem que o vidro era fumê...

   ...
_ Vai vendo aí, Marinete – disse Margarete inconformada. – A avó de Ana foi levada por um verdadeiro cavalheiro em uma Ferrari. Nós, muito mal, vamos de bicicleta ao serviço.

   ...
_ E estão falando que era um rapaz jovem e forte. O avô de Ana não pode nem sonhar – disse Marinete à Elizete.

   Anete terminava de lixar as unhas ruídas, pretendendo pintá-las de vermelho dentro de uma semana, quando o telefone tocou.
   Era Elizete.
_ Anete de Deus! Acabei de descobrir que a avó de Ana está traindo seu esposo. Marinete contou-me.
_ Jesus Cristo! É por isso que a vi ontem entrando em um veículo suspeito...    
   Neste momento, do outro lado da rua, Otília, a avó de Ana, saia do carro de seu marido. O novo veículo era fenomenal. Estavam contentíssimos!

2 comentários:

Naty Araújo disse...

O que uma "fofoca" não faz...

Brilhante conto, Rafa!

Ana Carolina disse...

Nossa, muito bom!
Aquele finalzinho bem humorado com uma "lição de moral".