sexta-feira, 17 de junho de 2011

Meu quarto, 25 de maio de 2010.

Aqui está muito frio. É um lugar vazio sem respostas e infelizmente sinto a temperatura cair a cada segundo. Fico pensando como você está e se nossa conversa teve algum efeito. Se depois de tudo algo diferente pode acontecer. Já tínhamos decidido mudar a situação toda. Não é culpa sua ou minha. Aliás, devo parar de achar culpados fictícios para as coisas. Culpados existem ou não.

Tenho ocupado meu tempo com os estudos. Algumas aulas são maravilhosas, outras nem tanto. Tenho escrito uma coisa ou outra, conversado bastante com amigos e tenho descoberto dentro de mim coisas que eu não conhecia. Às vezes, sinto-me ignorante. Cruel. Tenho noção disso. Gabriela, se sou tão cruel, você é muito ingênua.

Não peço garantias das suas idéias nem ações malucas. Não peço provas nem resistência. A multidão me incomoda. Odeio-a. E para ser sincero, a multidão me atrapalha. Não poderia me atingir, mas ela insiste nisso. Em frases, cartões, mensagens, ligações, propagandas... Cavam buracos verticais extremamente fundos e fazem questão de enterrar-me neles.

Algumas palavras minhas são tão frias. Outras, de um sofrimento imenso. Confesso que nesses últimos dias de ausência de voz. de grito de resposta, tenho me sentido mais inibido, vulnerável. Talvez eu não seja tão cruel.

O que você tem feito? Lembro-me de algo "invisível". De fato, sua invisibilidade se mostrou notória quando não vi nenhum registro seu. Esteve presente, mas impossível de ser encontrada. Perdi-me, buscando achá-la; às vezes penso que perdi. Perdi a vontade de continuar, de estudar, de escrever. Perdi a vontade de tocar, compor. Perdi a vontade de sentir, de batalhar. Perdi o desejo de lhe ver. Mas o desejo, infelizmente, não me perdeu. Não me deixou. Não me permitiu transgredir, pensar coisas horríveis, confundir minhas ações. O desejo não me libertou. Eu me fiz alforriado, mas o desejo não me soltou. Meus pulsos estão marcados pelas correntes do desejo. Não me permitiu pensar em outra coisa. E nem mesmo sentir outras coisas.

Gabriela, o que são essas palavras? O que exatamente quero com elas? É uma pergunta que você se faz sempre que me vê escrever ou fazer uma citação. Sei que eu não deveria estar aqui, nem mesmo insistir em permanecer. Eu queria ir. Para longe. Para o fim. As palavras têm funcionado como auto-destruição. Não fumo, não bebo, não me drogo, mas escrevo. Delírios gigantescos dentro de mim. E a sua voz é a que tenho escutado nesses delírios.

Isso não é uma declaração, parece-se mais com desabafo. É uma maneira de obrigá-la a ler todas essas palavras turvas que emanam dos meus dedos. Se eu utilizasse papéis, com toda a certeza, iria machucá-lo com lágrimas. Mas não quero usar mais papel. Estou me "artificializando" por fora para que eu sinta melhor por dentro.

E seu sorriso? Ainda amarga na sua boca? Ainda se parece com o som das lágrimas que você exala? Eu queria estar por perto para ver. Para lhe abraçar e firmar tua cabeça no meu peito e dizer que ficará tudo bem. Mas você nunca me deixou; não permitiu-me agir. Estou morrendo a tal ponto que pareço um morto-vivo. Pura carne, sem espírito. Sem razão. Instintivamente ajo assim. Porque só tenho me machucado nessas malditas pedras que você não me permite tirar do meu caminho. E você não as tira para mim.

Enquanto você lê, quem está do seu lado? Família, amigos, amantes ou seu novo marido? Você cresceu floresceu. Eu me escondi na terra. Fui escolhido pela multidão que tanto odeio. Enterrado pelas minhas palavras. Como eu queria gritar e bater a sua porta dizendo que ficarei eternamente do teu lado. Está vendo? Estou me expondo. Dilacerando-me. Às vezes, penso que você gosta disso. Você gosta, Gabriela?

Gabriela? Será esse seu nome? Será essa você? Que me tira o sono, que me faz sentir a dor mais aguda. E quem sou eu? Eu escrevo como se obtivesse algum desfecho no meio desse sofrimento. Sentado na grama, com um livro aberto, encarando um personage que eu nunca encarei antes: eu mesmo. Eu não suportei ler "Os sofrimentos do jovem Werther", como posso suportar essa auto-leitura? Diga-me, Gabi! (Desculpe a liberdade, Gabriela. Eu realmente não queria gritar com você.)

Vou encerrar logo isso. Essa carta longa e chata. Que não lhe fez sentir pena de mim ou chorar. Não fez efeito algum. Nem em mim. Estanque o choro e a rasgue, Gabriela. Rasgue e, por favor, sinta-se à vontade para gritar.

Com todo o carinho do mundo e poético,

Johann.

Um comentário:

renatocinema disse...

Acredito que essa foi uma bela declaração de sentimento, mesmo que a carta não tenha destino ou pessoa definida.

Sentimento a flor da pele.