quarta-feira, 15 de maio de 2013

O sonho da bailarina



As clássicas notas do piano, destilando Für Elise de Beethoven espantam o som do nada e preenchem as lacunas do ar dando vida a bailarina que se esquece de ser apenas um objeto para bailar em seu perímetro compacto.
Ela gira em torno de si mesma e ao redor do ritmo suave da melodia, como se o som se desprendesse dela e conduzisse o tempo e não o contrário. Sua dança solitária e sem plateia traz apenas o aplauso amargo da tristeza. Sua vida frágil nunca lhe proporcionara algo mágico e grandioso. Seu destino estava preso na caixinha de música, selado pelo imã que a sustentava sobre seu próprio peso insignificante.
A bailarina tinha um sonho, maior que o seu ser. Um sonho de libertar-se de sua condição inanimada e saltar nas pontas dos pés nos mais variados palcos do mundo. Ela tinha o sonho de ser reconhecida, de ter olhares ávidos sobre ela e expectativas sobre seus próximos passos... mas seu sonho se trancava no escuro quando a tampa da caixa era baixada.
Suas lágrimas irreais e invisíveis respingavam no piso e a escuridão engolia todas as suas esperanças de se tornar alguém que ela nunca poderia ser. Por vezes ela ouviu as pessoas dizendo que tudo é possível se você tiver fé o bastante e força de vontade, porém, essas mesmas vozes quebravam o silêncio de seus pensamentos para lhe dizer que há sonhos que jamais se realizarão, não importa o quanto você deseje e nem o quão forte seja sua fé. Então ela chorava.

A bailarina incansável e sonhadora nunca pisou em outro lugar a não ser aquele a qual sempre pertenceu. Ela nunca ouviu o som da ovação por uma apresentação sua e nunca mais foi capaz de dançar quando, por descuido, derrubaram sua caixa protetora e ela se desfez em vários pedaços espalhados pelo chão.
Seu grito mudo não foi ouvido por ninguém e sua queda não foi tão sentida, mas ela livrou-se, enfim, das correntes que a segurava. Sua pequena alma na forma de um floquinho de luz projetou-se pela janela e atirou-se na cauda do vento, onde ela valsou, rodopiou e inventou passos magníficos.
Hoje em dia ela ainda baila por todos os cantos, ao som de diversas canções e sinfonias. Livre. Despretensiosa. E mais sonhadora do que nunca.
Ela entendeu que alguns sonhos são realmente impossíveis, mas que também sempre há a possibilidade de trocá-los por um que não seja.

Clique no nome da música pra ouvi-la, caso não a conheça. 

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