quarta-feira, 25 de julho de 2012

Morte da vida, assassino das vontades

♪ I'm gonna lose my baby,
(Eu vou perder meu amor,)
So I always keep a bottle near ♫
(Então eu sempre mantenho uma garrafa por perto)
Rehab - Amy Winehouse

O balanço me levava conforme o vento. Entre os estágios mais veementes dos recônditos de minha alma, ali estavam meus pensamentos. A garrafa de bebida na mão esquerda, o copo na direita e as ideias interligadas entre os dois próximos pontos até chegar aos meus lábios. Não há esperanças, não existem mais possibilidades de uma vida feliz e tenra ao lado das pessoas e das coisas que gosto. Minha companhia é um copo e meu amante é uma garrafa.
Levantei-me, quase trôpego, adentrei em casa e fui ao vestíbulo melancólico de minha suposta morte. Lá encontro a dor que sinto desde o dia em que vi o corpo dela esticado e sangrando, expelindo os resquícios de vida que ainda lhe restavam.
Estavas encolhida em um canto da sala, e quando eu a tinha sob a minha mira, eu fechei os olhos e puxei o gatilho. Foi como se eu tivesse atirado em mim mesmo, a diferença era que em vez de sangue, eu sangrava lágrimas.
Não queria matá-la, não agora, não mais, não desse jeito. Mas, matei-a. Matei, porém o que queria era saciar o desejo, a esperança e a busca por seu corpo, por sua presença. Queria exterminar a vontade de tê-la comigo. Extermino-a todos os dias, porém a vontade ainda continua.
A cada gole, eu a desejo de volta; a cada entrada em casa, eu a vejo naquele canto da sala, sozinha e a tenho sob a minha mira. Um dia não haverei de matá-la e correrei para aquele lugar a sua procura ou, quem sabe, conseguirei assassinar o meu anseio por ela. Na verdade, todos os dias a procuro, mas não encontro. E atiro, não porque não a amo, mas porque lembro que sua morte aconteceu ali naquele canto. Mataram-na, isso me dói. Tento refugiar-me a cada gatilho puxado para sanar uma dor que não terá seu fim.
Aquele brutal assassino tirou o sangue do corpo dela, mas de mim ele tira lágrimas todos os dias. Minha mulher morreu subitamente com um tiro no meio da testa, eu, porém, morro todos os dias com uma facada no peito, uma lágrima escarlate e dores pungentes. O sangue daquele corpo estendido não voltará, pois uma vida chegou ao término. Agora, outra vida se esvai lentamente: a minha.

# Pauta para o Bloínquês

Um comentário:

Thuan Carvalho disse...

Um tiro,
Duas vidas que terminam:
Uma delas pelo sangue que escorre, denso e límpido;
A outra, pela eterna tortura de ter sobrevivido.

Muito bom o texto.

Legal a iniciativa do blog, vou seguir =]