Lá fora a chuva trepidava violentamente. Era noite e verão. O calor abafava a todos os moradores de Juiz de Fora, e, todos eles, incluindo Matheus, ligavam os seus ventiladores.
Matheus era um adolescente de aproximadamente dezessete anos. Alto, esguio, de cabelos longos e o rosto pipocado de espinhas. Já possuía algum charme – mas só para olhos treinados. Vestia-se freqüentemente de preto. Sonhava em ser guitarrista de uma banda de rock. Para isso, tomava classes duas vezes por semana. E praticava... Como praticava! Praticava até mais que os problemas de física que tanto o encantavam. Um plano B não lhe escapava aos sentidos: se a empreitada musical fracassasse, se tornaria físico nuclear. Morava em um sobrado amarelo, em frente à Praça da Baleia, na Rua Irmão Martinho.Aproximando-se à janela, vislumbrou uma mulher apressada. Em seus braços uma pequena menina, de cabelos estranhamente loiros, chorava; talvez assustada pelos raios e trovões. Ambas protegiam-se com uma sombrinha vermelha. A mulher fez sinal com a mão livre. Um taxi parou. Levou-as. Não fosse pela água que insistia em cair incessantemente, a rua, agora, estaria morta.
O ventilador mantinha-se em movimento. Matheus sentia minuto após minuto aquela rajada de ar refrescante. O ruído do aparelho lhe invadia os ouvidos. Perdeu-se em pensamentos, até que escutou três batidas na porta.
_ Pode entrar! – gritou em tom neutro.
_ Boa noite, filhão – disse Jaime com entusiasmo ao abrir a porta. – Tudo ok?
_ Sim – respondeu contrariado, tentando forçar simpatia. – E com o senhor?
_ Tudo ótimo! Acabei de chegar. Estava com Carmem.
O rosto de Matheus contorceu-se em algo indecifrável.
_ Legal... – disse, ironicamente.
_ Vejo em seu rosto que não há nada legal – contestou o pai com um meio sorriso, acrescentando entre dentes:
_ Ela nos convidou para jantar em sua casa amanhã.
O jovem fixou-se no ruído do ventilador. Meditou alguns segundos, e, tomando cuidado para não soar ríspido, respondeu:
_ Eu não tenho que achar legal ou não. Ela é sua namorada.
_ Eu sei, filho... Acontece que amo vocês dois.Gostaria de vê-los bem. Então... Você topa? – perguntou novamente. Dessa vez com um olhar suplicante.
_ Topo – concordou a contra gosto. Não queria feri-lo.
_ Obrigado. Prometo-lhe que teremos uma noite fantástica – disse, com um sorriso largo. Abraçando o filho, acrescentou:
_ Dorme com Deus, campeão!
_ O senhor também.
Jaime afagou os cabelos do filho e saiu. Matheus colocou o pijama, escovou os dentes,e se deitou. Não é que detestasse Carmen. Apenas achava que tal relacionamentode seu pai era um ato inconscientemente desesperado. “Homens e essa maldita mania de não saberem ser sós,” pensou.
_ Jamais colocarei ninguém em seu lugar! – murmurou decidido.
Lembrou-se da mãe antes de falecer. Calorenta como ela só! Tinha o hábito de ligar o ventilador, se assentar na cama com o filho e lhe contar estórias. Quando o menino estava prestes a cair no sono, ela expressava a sublimidade de seu amor através de um beijo na testa ou na bochecha, e voltava ao seu quarto – sempre reclamando do tempo. Até mesmo com o estrago que o câncer causou, não perdeu o bom humor, e, muito menos, o hábito de se queixar.
Matheus exibiu um sorriso faceiro. Enroscou-se nas cobertas. Embriagou-se por rajadas de vento e ruídos. Pôde ver, pôde sentir: ali estava a mãe – nas noites de calor ela sempre voltava.
6 comentários:
Parabéns Rafael.....adoro passar aqui e me encantar com os contos.....sou fã do site.
Amei o conto Rafael! É um prazer ser amigo de um talento como voce!
amei Rafa muito legal como sempree !!! Parabéns meu amigooo bjaumm
Olá, pessoal.
Eu fico extremamente feliz com os elogios que vocês postam. Muito, muito, muito obrigado. Eu espero sempre escrever boas estórias e corresponder às expectativas de vocês.
Abraços
que lindo. queria ver como era a escrita do novo (já passou um tempo, mas eu demoro ter tempo pra ler tudo aqui :S) integrante, e é realmente boa. adorei o texto.
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