terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Superação


Abri a janela do quarto do hospital, ainda sonolenta, o sol batia enjoativo em meus olhos. Voltei a fechar, não tinha graça observar do alto, aquelas pessoas perambulando pelas ruas, procurando o que fazer, fofocando e distribuindo falsidades.
Voltei rapidamente para a cama, antes que alguém pudesse enxergar-me de pé.
Eu queria mais do que tudo sair daquele lugar, três dias trancafiada, sem nada interessante a fazer, sem amigos, sem minhas vontades, meu êxtase de felicidade.
Fechei os olhos e acabei caindo no sono.

- Ei, Katlyn, acorde!
- Diga, enfermeira.
- Você está melhor?
- Sim, estou, com vontade de ir embora. Já posso?
- Só um instante.
Aquele instante mais parecia uma eternidade, aquele cheiro de hospital, a alimentação horrível, precária, dava ânsia e vontade de sair correndo pelo corredor e fugir daquele lugar.
Perdidos pelo vidro, encontrei os olhos de mamãe procurando os meus. Na verdade era a última coisa que queria ver, os olhos dela. Ela em si!
Abriu a porta e disse que já podia ir pra casa. Nada como uma ótima notícia pra aliviar a sua presença.
Troquei as roupas, calcei o salto e parti em rumo à realidade que havia se tornado um sonho.
Ao passar pelo corredor, fui até o pátio beber água, enquanto esperava mamãe pegar alguns papéis do meu exame com a médica. Sentei-me, ainda com fraquezas, por causa do soro que havia acabado de tomar. Vi uma garotinha, seus olhos brilhavam em frente ao espelho. Não aparentava ter mais do que 10 anos, sua cabeça crua, sem um fio de cabelo sequer. Ela se olhava feliz, dava um sorriso esguio. Pegou uma canetinha ao lado da sua cadeira e começou a desenhar no espelho. Fez cabelos e sorria mais ainda, dava gargalhadas enquanto fazia. Trocou a cor e fez laços nas pontas.
Seu olhar deixou escapar uma lágrima, a esperança ainda existia naquele coração e a coragem de encarar seus problemas, logo naquela idade, já era um sinal de superação.
Aprendi, olhando aquela cena, que eu tenho tudo que quero. Frequento baladas, bebo até cair e acabo sendo internada por tantas besteiras que faço. Saio a hora que quero, faço o que quero quando dá vontade, reclamo, choro, grito, me desespero, mas não tenho problemas tão graves quanto os daquela garotinha que mal deveria saber o que significa a palavra problema.
Ela tão cedo já sente o que é isso e eu, velha que sou aos meus 27 anos, não sei qual tamanha é a dor que se passa naquele coração. E mesmo se eu soubesse, não teria força o suficiente para contemplar minha face no espelho e ver que meus vaidosos cabelos, não mais encontram-se no lugar em que devia estar.
Ela sabe o que é sofrer e sabe o que é superar. Eu não sei o que é sofrer e mal supero algumas besteiras do meu dia a dia.

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