Meus olhos seguiam cada cena com atenção, me sentia extasiada com cada abraço de reencontro, mas logo o coração ficava pequeno, e se fazia buraco negro que sugava com força o meu êxtase enquanto a minha visão contemplava aquela despedida ali no canto. Um jovem casal com mãos que não queriam mais se soltar. Depois o choro da menina que mantinha a mão erguida firmando aquele adeus. Foi triste, e eu disse que havia caído um cisco no meu olho para uma menininha que me encarava curiosa. Dei algumas fungadas e ouvi o apito do trem soar, estava me chamando. Andei em passos preguiçosos, e senti uns tapinhas em minhas costas.
- Bem na hora. - disse eu.
- Desculpe o atraso, querida. A sua avó estava me empurrando aqueles biscoitinhos de manteiga com amendoim, e você sabe que eu não consigo resistir.
- Ah, claro vovô, o senhor ainda vai me trocar por esses biscoitos... - arqueei uma sobrancelha o encarando.
- Ah Liz, não seja tão dura com o seu avô, você sabe que eu não faria isso. - me abraçou afagando o meu cabelo como quem afaga o pelo de um gato manso.
- Vovô?
- Sim?!
- O senhor passa muito tempo com aquele gato preguiçoso.
- Não fale isso do Sr. Bigodes, ele é tão bom com você...
- Ele só me procura quando tem fome.
- Ah, isso não é verdade.
- Ta bom, quando quer carinho também. - sorri. E ele me fez uma careta. Mais um apito soou anunciando a despedfida.
Eu nunca gostei de despedidas, e já estava falando até do Sr. Bigodes para evitar aquelas palavras que nos arrancam lágrimas de saudade.
Eu olhei para o meu avô, e ele me lançava aquele olhar esperançoso, de quem sempre vê o lado bom das coisas. Ah, eu queria ser mais como ele.
- Querida, não precisa olhar para trás, os calcanhares estão no lugar de sempre. - sorriu docemente. Tão sábio...
- Vou sentir saudades... - não pude evitar a voz falha. O abracei com força em seguida. Ele retribuiu o abraço caloroso.
- Não é um adeus, é um te vejo logo mais. - disse em voz rouca. Pigarreou e me manteve ainda firme nos braços, ele não queria que o visse chorar. Eu o entendo, porque sou como ele nesse aspecto.
O último apito soou cansado e exigente, me obrigando a desvincular-me daqueles braços firmes. Limpei a voz e tentei sorri para ele.
- Te vejo logo mais. - beijei a sua testa. E ele sorriu satisfeito. E sei que ele acredita nisso; sei que ele acredita que cinco anos podem caber em um logo mais. E eu também acredito, porque estou tentando aprender com ele sobre o lado bom das coisas.
Ele aperta a minha mão e beija o topo da minha cabeça.
- Diz a vovó para moderar na manteiga. - eu brinco.
- Digo sim. Mas ela vai ter que exagerar nos amendoins. - pisca para mim. E nós rimos alto. Viro as costas, tentando não olhar para trás. Porque os calcanhares estão lá, sempre estão.
Entro no trem, e passo a manga do suéter no vidro da janela. Ainda vejo o homem em postura invejável chorar. Ele acena e finge que tira um cisco dos olhos. Eu solto uma risada abafada enquanto o trem se distancia e o meu coração começa a apertar. A saudade chega faceira e se instala em algum lugar do meu peito. Mas atino a memória e lembro do te vejo logo mais, isso me conforta de alguma maneira. E enquanto eu estiver naquela universidade eu irei me lembrar dessas palavras.
- Sim vovô, te vejo logo mais... - repito baixinho para ninguém.
Um comentário:
Lembrei de minhas despedidas ao longo da vida.
Lindo.
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