sábado, 20 de agosto de 2011

Sede de mundo


Debruçou-se na janela com aquela sede de mundo, os olhos movimentavam-se ligeiro acompanhando o movimento lá fora. Tudo era convidativo; tudo sugeria uma dança, mesmo que essa fosse breve. Ela queria, era isso, e mais nada.

A menina de pouca idade e mochila de carga leve, carrega na face os traços inexperientes da vontade de desbravar continentes. E o rosto sonhador pregado no horizonte que acaba de mudar de cor, só faz o outro constatar que o entendimento é pouco, ou quase nenhum.

Ele já tem as rugas presas, e uma bengala torta. Diz que o tempo o arrasta para onde vai dentro de uma sacola. A menina ri, diz que o avô é engraçado, e que um dia quer ser arrastada assim, pelo menos guardada dentro de uma sacola sem furo. Pois ficar para trás é triste – ela constata.

Então já vai, abre a porta sem virar para trás porque nunca gostou de despedidas. A promessa de volta é irregular, ela já avisou, só volta se o mundo permitir. O avô entorta a cara, fala manso, e bate na barriga, avisa sobre as marcas que ela vai tatuar no corpo, e que a porta vai ficar aberta, porque no final o que se quer é voltar pra casa.

Ela ajeita a mochila, fecha a porta devagar, coloca seus dezessete anos no bolso que é para ninguém querer julgá-la.
E para os seus sentidos a rua nunca esteve tão viva, e o asfalto nunca esteve tão quente. Ao parar numa esquina percebe que as coisas às vezes desandam, e que nem tudo é só sonho. Ela chora, alimenta aquele jogado no chão, mas sabe que o alimento não é a solução, ainda é pequena, não entende muito de mundo – foi o que o avô sempre disse. Teve vontade de voltar, ainda mais quando a chuva começou a molhar os seus sonhos, encharcando-os até ficarem pesados demais para planarem. Mas viu que atrás duma nuvem um raiozinho persistente sobressaia-se, era o Sol, ele nunca desistia.

Em passos pesados voltou a andar, tirou os sonhos do chão para não serem pisoteados, os espremeu com vontade, até sentir que eles já estavam prontos outra vez. Teriam de voltar para o lugar onde sempre estiveram, lá no alto, além das nuvens carregadas. Ela observou enquanto eles subiam. Fez um sorriso abrigar o rosto, e a coragem dançar no peito. E depois foi a vez dos passos ritmados, um na frente do outro, sem pressa e sempre em frente.

2 comentários:

Jéssica Trabuco disse...

As vezes me sinto assim. Uma menina que está caminhando atrás dos seus sonhos se realizarem.
Gostei muito do texto.

renatocinema disse...

Correr atrás dos sonhos....é o sentido da vida.