domingo, 30 de dezembro de 2012

As Caixas Ingratas Que Pesam Mágoas


Você chega. Com certa dificuldade, deposita, num canto, uma caixa tosca e acinzentada. Há outras, também colocadas por suas mãos, desorganizadamente dispostas pelo ambiente. São altas, largas, compridas e pesadas. Sobretudo, pesadas. O cômodo amplo comporta-as bem. Está no último andar de mim, do prédio, a consciência, a cobertura da edificação.
   Ignorando a base, você se deixa levar pelas aparentes paredes, tão belas, atrativas e acolhedoras. Parecem-lhe fortes. Talvez, até mesmo, indestrutíveis. É por isso que as habita. Você, mais do que ninguém, precisa de uma fortaleza palpável que o guarde. O exterior, aqui, não arranha, não fere. O tempo, aqui, não age. É sua garantia. É sua garantia de vida.
   A moradia lhe custa o mínimo que possa pagar. Ela conhece os seus recursos, sabe o quanto pode dispor. Você, entretanto, não traz o que é pedido. Em lugar, se revolta e traz caixas: as caixas ingratas que pesam mágoas.
   E pesam... Ah! Como pesam...
   Fatigada, então, a salvação lhe trai: eu estalo. O som abafado se repete em todas as direções. Rachaduras ferinas surgem em superfícies, se confundindo aos arabescos. A estrutura, por fim, crise.
   Incrédulo, sem perceber que o rompimento fora causado por sua própria displicência, você corre em direção à saída, ofendendo a estrutura que, em vão, tenta se manter de pé.
   Você sai, caminha e para, enquanto suas ofensas se apressam por corredores e cômodos. Olha para trás. Vê-me em frangalhos. A edificação desaba, pois, também seus braços, mesmo fracos, a sustentava. Dá-me as costas e se vai, chamando-me “passado”. Deixa as caixas sobre os escombros, pesando o que ainda sou. Por debaixo das ruínas, a sua voz ecoa: ofensas; verdades?
   Ecoa...
   E não sei o que fazer.
   Ecoa...

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