sexta-feira, 26 de outubro de 2012

O sexo não frágil


Duas horas da manhã e o homem bêbado andava na penumbra da madrugada na direção que o levaria a estar numa casinha humilde no bairro mais pobre da cidade. Da sala que também era quarto, - porque na casa só havia três cômodos sendo eles banheiro, cozinha e quarto sala, todos minúsculos – Doroteia segurava um rosário nas mãos e rezava baixinho enquanto olhava o pequeno filho dormir.
O embriagado que vinha da rua, o tal de Sérgio, seu marido, chegou na porta fazendo muito barulho com seus passos trôpegos. Os olhos de Doroteia arregalaram-se no mesmo instante e suas mãos pousaram o rosário no colchão da criança. Pedrinho estava com febre, tardara a dormir e seria até um pecado aquele infeliz chegar cheio de cachaça na cabeça e acordá-lo agora. Sorte que ao abrir a porta ele não fez que esta colidisse com a parede quase fazendo a casa desmoronar, como fazia todas as vezes. Por sorte.
Adentrou com um cheiro tão forte de pinga, que impregnou na casinha toda. Olhou para a mulher com olhos vermelhos de demônio, mas não abriu a boca para pronunciar palavra. Foi direto para a cozinha na geladeira. Pegou a única caixa de leite que ali havia.
Doroteia, que aproximou-se cautelosamente para espiá-lo, avançou bruscamente para cima dele quando este abriu a boca para virar o leite da caixinha diretamente em sua garganta.
- Você não vai beber o leite do meu filho, desgraçado! Passa o dia todo no bar e agora vem tirar o último leite que tem pra criança beber? Mas não vai mesmo! – Doeu-se ela esbravejando baixo para o menino não acordar.
- Como assim não posso tomar leite dentro da minha própria casa? – Questionou aos gritos no mesmo momento em que a pegou pela garganta - Se vai me impedir disso, é melhor que morra! – Completou cerrando a mão cada vez mais firme no pescoço da mãe desesperada que estava protegendo o único alimento do filho que agora berrava no berço. E ele a foi empurrando para a parede sem lhe soltar a garganta. Mas quando passaram ao lado do fogão, ela passou a mão por cima deste sem enxergar, visto que seu rosto era mantido para frente, e sentiu o que sabia que havia deixado ali: a faca. Sérgio a soltou imediatamente para tentar tirá-la da mulher,  porque nunca acreditara que o sexo frágil fosse capaz de ser mais forte, quanto mais de esfaquear um homem. Então Doroteia pôs-se de frente para ele, que já ia tomar-lhe o objeto. Mas ela foi mais rápida lutando contra a força do homem e passou de raspão a faca afiadíssima na pele do pescoço do bêbado carrasco que tentava segurar-lhe as mãos. E bastou. Um cortezinho de nada que pegou no lugar certo.
O homem caiu no chão. Só então viu do que o sexo frágil era capaz - mesmo que surpreendentemente fatal - fosse pra se defender, mas principalmente para proteger a vida de um filho.

Um comentário:

Ângela disse...

Passando para conhecer e já ficando, adorei o blog.
Bjs