sexta-feira, 7 de setembro de 2012

II Semana Especial: A despedida #Dia07





Talvez não apaixonado nem esperando boa-aventurança, chorou o que lhe restava de ternura na árida jardineira da entrada. Os olhos vermelhos denunciavam a profundidade da alma. Mas sabia: em terra de ninguém não brota amor. Cansado, mas com aquele cansaço dos que se resignam, sentou-se na soleira da porta para um último cigarro. Não haviam lhe contado muito dessa coisa de amar, ainda assim, ele arriscava-se. Os mais sábios - ou estúpidos! - resguardaram-se na promessa, na premissa, de que as boas coisas vêm, vêm, haverão de vir pelo motivo que seja. E então esperam, nas soleiras das calçadas invisísiveis do destino, crentes que o próprio destino sempre acontece. Os descrentes - ou tristes! - não, não esperam mais, perigam por ruas escuras de bairros que ninguém sai às portas, e os que saem pouco se importam com os que passam. Deslizou a cabeça para o lado e, ao olhar para os lados, constatou que não era sozinho que levantava muros, abobodava sonhos e convocava nuvens para cobrir tudo, tudo, até a última fresta de estrelas mortas. Paredões e um céu acinzentado, chumbo, cimento, desesperançoso, pendia da imensidão sobre todos; e se viam pouquíssimas janelas acesas para a vida.

Resolvesse insistir ou não, aquela noite portava-se como uma dama inquisitória. Majestosa, com seus longos cabelos de breu, estendeu sua tristeza além de onde se traça o horizonte. Decretada que toda forma de assombro se erguesse na bruma espessa das calçadas, sentia-se cair aqui e ali inocentes e condenados. Não havia um só ruído. Não do lado de fora. Dentro do peito, internamente, sentimentalmente, peremptoriamente, o coração convulsionava-se arrasado em contabilizar quantos votos haviam se quebrado. Estava farto dessa coisa de pular de bolso em bolso e, agora que voltara, maltrapilho e esfarrapado, procurava abrigo. Jurava com tudo o que tinha que não o faria outra vez arbitrariamente, que não fará, não fará, até apaixonar-se novamente. Mas não sabia com exatidão o que era estar apaixonado, nunca recebera de volta a sutil reciprocidade epistemológica de amar. Não se sabe se por estupidez ou negligência, mas estamos diante daquela velha história de um coração castigado que se apaixona a troco de coisa alguma.

- Ele te quer perto, idiota! - tentou gritar um coração contidamente desesperado. Mas ninguém estava na rua, ninguém. Nem o velho da casa do grande terraço, nem o gato branco que percorre os jardins areiados e nem a sorte, em toda a sua venerabilidade, passeava por ali assoviando os destinos alheios. Sozinho, plenamente sozinho, conheciam bem a sensação. Tanto o dono quanto o coração. Sentiam-se derrotados, a sensação quente, a mão que treme encostando-se ao peito.  - Pelo amor que nunca acontece. - dessa vez bradou ele, baixinho, escorrendo pelo canto da boca e rompendo o véu de silêncio irremediavelmente. Até a noite abrandou-se com naquele momento, ciente do que acabaria por testemunhar: às vezes o coração da gente quebra, sabe? E quando acontece cada estrela se torna inútil quando nos escorre aquela última lágrima. O momento em que ninguém diz nada, mas sabemos que perdeu a graça, que tudo se torna vazio, ausência, nada. Entrega-se os pontos, abaixa-se as armas, dispõe-se a deixar o amor - que nunca aconteceu! - partir para qualquer canto que seja. O que não pode ficar, deve ir embora.

A noite continuou arrastando-se vagarosa, como mãe dos que choram, com seu vestido nublado. Era uma despedida. Tocada, soprou o sereno de sua madrugada no rosto do moço triste. Ele, com os olhos fechados, conformou-se serenamente e respirou profundamente aquele suspiro que enterra sentimentos no fundo da alma. Ergueu-se, ainda com o coração em frangalhos e desceu a rua cantando alguma dessas baladas de amor - que nunca acontecem! E, embora praguejasse por dentro e por fora, o moço haveria de acontecer mais outras vezes, haveria de acontecer sim, sobre o amor. Porque não importa o que lhe acontecesse, continuaria a acreditar no amor, porque bem sabemos: simplesmente acreditamos. Talvez um dia compreendamos: o amor é maior que a própria noite. O amor é maior que qualquer coisa.

E com esse conto mais do que especial de Cristiano Guerra - o para sempre fraqueado que deu início a isso tudo - fechamos a Semana de Aniversário da Franquia e logo voltaremos com as postagens regulares, do jeito que fazemos desde sempre.

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