quinta-feira, 26 de abril de 2012

Luz do e ao


A gente estava indo jogar conversa fora debaixo da antiga árvore de sombra farta nos dias quentes. Era tarde de domingo.
Quem não fosse um de nós não poderia entender nosso jeito louco de conversar: um falando junto com o outro, e rindo aos intervalos. Uns socos no braço de um, umas rasteiras no outro, uns empurrões... Mais risadas. Éramos garotos homens, afinal.
Mas ao chegarmos – eu e meus outros dois amigos – no local que nos deixava de frente com a tal árvore, tudo ficou diferente. Eu não ouvia mais a voz nem a risada de nenhum deles. Também não sentia socos nem empurrões que davam em mim. Porque de repente, tudo perdeu a luz. Tudo ficou cinza, como meu mundo realmente ficou quando a perdi. Mas no balanço tinha uma luz. E lá estava ela, com os pés cruzados a uns centímetros do chão. Segurava nas cordas do balanço pendurado num galho forte, que havia lá desde quando éramos crianças. Mas, mantendo-se de cabeça baixa, ela não balançava, não fazia movimento algum. Porém continuava ali. Eu podia vê-la em cores enquanto todo o resto era sombrio. Seu corpo de anjo iluminava o balanço e um pouco em torno de si.
Então eu olhava intrigado, emocionado, como se nunca a tivesse visto depois que falecera. Era tão inacreditável, que esfreguei os olhos. Mas ela não sumiu. Apesar disso, eu tinha a sensação de que ela desapareceria logo que eu estivesse perto demais para tocá-la. Então tirei o celular do bolso e direcionei a lente da câmera para ela. Eu ainda a via. Tirei a foto. Mas depois do clique quando olhei de novo para o balanço, ela não estava mais lá. - Ela aparecia apenas por um curto tempo, todo domingo, naquele mesmo balanço. Pelo menos dessa vez eu havia tirado uma foto. Uma pena não poder ver seu rosto sempre cabisbaixo. Mas o que importava, é que era ela.
Então fui buscá-la nos meus arquivos do celular. Tudo tinha cores na imagem: o céu, a grama verde, o balanço, a antiga árvore. E ela? Sumira inexplicavelmente deixando tudo em cores de novo. Fiquei olhando por uns segundos o balanço vazio na imagem.
Tudo voltara ao normal e agora quem estava de cabeça baixa era eu. Levei um empurrão de algum dos amigos que me acompanhavam – Eu tinha até me esquecido deles – e só então levantei a cabeça, voltando à realidade. Era sempre assim todas as vezes que eu via o balanço que brincávamos desde pequenos, nos revezando na hora de balançar. Paranormal, ilusão, real, não importava o que era. Eu poderia ser um louco, paranóico, ou um apaixonado cheio de saudade. Não dizia nada a ninguém sobre tal visão e sentimento, porque eram tão intensos e meus, que era impossível demais compartilhar.
O fato é que meus pés pisavam no solo firme, mas minha cabeça flutuava em algum lugar paralelo com o pensamento implorando para que o cinza voltasse, para que então só Alice pudesse ser e trazer a luz. Luz do e ao ambiente, luz do e ao meu coração.
"Apareça e me espere chegar mais perto, Alice. Apareça e levante a cabeça, que eu te balanço, querida." Meu pensamento suplicava.

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