domingo, 20 de março de 2011

O fim



O rapaz entrara por aquela porta, e permaneceu parado, estarrecido, encarando-a com tamanha destreza que ela se sentiu incomodada. Ele, que dias antes havia dito que não a queria mais, agora estava lá no meio da escola, na frente de todo mundo apenas para vê-la.
Dias antes, era carnaval. As noites lotadas de pessoas por todos os lados, a música dançante estimulava os sentidos e a festa só parava de manhã. Era o primeiro carnaval dos dois, e consequentemente seria o melhor, mas não foi. Um passo em falso e tudo desmoronou, não era o dia certo, nem a hora certa. Ela lembrava nitidamente de vê-lo beijar aquela outra garota, desconhecida, e as lágrimas cairam mesmo sem querer. Ele se vingara.
Mas agora não tinha importância alguma, as palavras duras do rapaz não saiam de sua cabeça, aquele beijo meio que forçado e sua tentativa frustada de reconciliação, tudo doía. As lágrimas não cessaram, os dias passavam e ele já estava prestes a ir embora. O carnaval se foi, mas deixou sequelas. Logo, logo ele também iria embora e deixaria mais marcas em seu coração.
Uma mulher quando se apaixona, pelo menos com ela funcionava assim, não importava o que ele poderia pensar, mais ela iria lutar por ele até o fim. Pelo menos enquanto ele estivesse por perto. Ela sentia que no fundo valeria a pena, no fim ela poderia até se arrepender, mas do fez e não do que deixou de fazer.
Como ele dissera uma vez "você sempre foi tão fria assim?" Sim, ela sempre foi. Não queria demosntrar que o amava por medo, por orgulho.

Mas decidiu  mudar por vontade própria, indo contra tudo e todos, era madrugada e chovia. Mas ela foi na casa do rapaz, mesmo assim. Batera em sua porta e alguns minutos depois ele atendeu. O cabelo liso estilo escovinha estava mais assanhado que o normal, as olheiras nos olhos dele a fizeram ter certeza que ele não dormia desde o carnaval. Um "oi" meio do avesso e trêmulo saiu da boca da moça. Ele estava assutado por vê-la no meio da madrugada, toda molhada da chuva, coração fadado, olhar sem expressão alguma e um sorriso triste que não mentia sobre sua dor.
Ele a convidou para entrar e perguntou porque estava ali. "Também me faço essa mesma pergunta", ela respondeu. Mais uns minutos de silêncio se seguiram, quando ela resolveu perguntar.
"Ainda sentes raiva de mim?" Ele não respondeu mas ela sabia que sim, e sua única vontade era de beijá-lo e pedir desculpas pelo que ela havia feito e esquecer tudo que passara desde então. Mas não o fez. As lágrimas queriam insistentemente derramar sobre seus olhos e expor todo esse sofrimento que a matava aos poucos. Mas não chorou, não naquele momento. Guardaria as lágrimas para depois.
"Eu só quero pedir desculpas, por tudo. Você vai embora e achei digno da minha parte que você me perdoasse, escuta, eu não durmo a dias, e não quero te ver ir com raiva de mim. Você só volta daqui um ano, é muito tempo e eu não me perdoaria se você fosse com esse ódio todo de mim. Quanto ao que tu me fez, eu já perdoei porque ao contrário de você, não guardo tanto rancor, faça o mesmo é só o que eu peço. Eu gosto tanto de você, bastaria isso pra teu coração perceber o erro que tá comentendo?" As palavras sairam muito rápidas, meio atropeladas e ela se arrependeu de algumas coisas que disse, mas era tarde. Esperou a resposta.
"Se é isso, já ta perdoada. Não é que eu guarde rancor, mas você também não é nenhuma santa e a garota que eu achei que conhecia mudou totalmente. Eu não te conheço mais. E acho melhor não me aproximar dessa nova mulher que surge aí. Eu não vou embora com raiva de você, mas não a quero de volta. Você foi a melhor coisa que eu já tive na vida e eu também gosto muito de você, se é que você ainda não percebeu."
Era um adeus.
As palavras dele doíam, e as lágrimas finalmente surgiram no caminho de volta pra casa. Ele não a amava como ela pensava. Se houvesse amor, também haveria o perdão e ele não a perdoara de verdade, ela sabia, ela o conhecia.
Naquela manhã de terça-feira ela acordara assutada, se arrumou e foi pra faculdade. Chorava e confessava sua tristeza para as amigas, ele iria embora naquele dia e ela nem se quer o veria uma última vez. Mas sua raiva a impedira de ligar pra desejar uma boa viagem, um até breve ou até nunca mais. Ela não prestou atenção ás aulas, não deu atenção aos amigos, sentou na última carteira e deixou as lágrimas rolarem, desceu para o intervalo com vontade apenas de sentar e fechar os olhos.
Ela então ouviu um barulho desesperado que vinha da diretoria e reconheceu a voz que tantas vezes soara em seu ouvido dizendo "eu te amo". Ele apareceu por entre as pessoas que andavam pelo corredor, foi em sua direção, quando a viu parou. Nenhum dos dois ousaram desviar o olhar, nenhum dos dois ousaram se quer conversar. A sua raiva implodiu e depois desapareceu quando viu que ele estava lá por ela. Mas ainda sim manteve firmeza e frieza mesmo com suas mãos tremendo e suando.
"Estou aqui por você, pra te ver pela última vez. Estou indo embora daqui alguns minutos..." Ele disse, cabisbaixo. A expressão no olhar dela mesmo sem querer se tornara fria e insólita. Todas as palavras duras e sem coração que ele houvera proferido a ela, agora pairavam sobre sua cabeça, e o rancor crescia inconscientemente dentro dela. Ele continou:
"Eu não te perdoei naquele dia, mas eu pensei nas coisas que você me disse. Você foi o melhor relacionamento que já tive e não faz sentido eu ir embora assim, desse jeito, então... eu só queria te ver pra não esquecer teu rosto, a tua beleza, pra mim não te esquecer, eu não quero te esquecer..."
Ela ouviu, atenta. Ele esperou resposta, uma resposta convincente, um abraço, um adeus com gosto de saudade, talvez um beijo. Mas nada disso aconteceu. As pessoas ao redor olhavam com curiosidade para o casal que resolvera de última hora se perdoarem, e por mais que ele tentasse manter a discrição, as pessoas conheciam bem um olhar apaixonado e já quase poderiam adivinhar o que viria a seguir. Mas ela apenas olhou para o lado, sem conseguir encará-lo e disse:
"Então, já me viu. Faça uma boa viagem, cara." E saiu pelo corredor. Ele não foi atrás dela, ela não olhou pra trás. Ele já estava atrasado e foi em direção ao carro. Do segundo andar ela pode olhar a rua, ele já estava partindo quando a viu, ela chorava insistentemente e ele viu as lágrimas, mas era tarde demais. E ele se foi com seu coração em pedaços, ela continuou chorando e no fundo eles sabiam que se veriam de novo, que conversariam de novo, mas seria totalmente diferente do que eles foram um dia.

3 comentários:

renatocinema disse...

"As palavras dele doiam".....que palavras não doem em 99% das vezes?

A imagem do texto é espetacular, emocionante.

Letícia R. disse...

Aiin que triste. Meu primeiro ex namorado é frio, orgulhoso assim, como ela. Só que nem tanto. A personagem ainda consegue ser mais, rs. Oin, amar alguém frio assim é frustrante quando chega nesse ponto.
Bom texto (:

BlackRabbit disse...

bom texto...
^^