segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

O amor de um assassino


- Larissa, eu não posso ficar com você. – Eu dizia firme, como se eu num sentisse nada por ela.
- Você sabe que pode! – Ela respondeu, ignorando a aspereza das minhas palavras. Ela sabia que eu a amava.
Num ímpeto, levantei da cadeira bruscamente, cerrei o punho e desci a mão na mesa, dando um soco cujo barulho quebrou o silêncio entre nós. Larissa me olhou com os olhos atentos, meu movimento violento e repentino a havia assustado. Eu me doía por dentro, por estar fazendo aquilo. Se eu pudesse, me desmancharia em lágrimas, como ela se desmanchou após se assustar.
Mas eu tinha que arrumar uma maneira dela se convencer que não merecia ficar com uma pessoa como eu e ir embora. Queria abraçá-la, pedir perdão, dizer que não queria fazer aquilo. Mas ela tinha que me deixar, partir, me esquecer. Então fui violento para que ela se assustasse. Funcionou. Ela chorava, porque me amava... Sem saber que aquele que ela acabara de ver ser agressivo, era meu verdadeiro ser. Aliás, só uma parte do que eu realmente era. Eu quase voltei atrás, vendo-a sofrer tanto. Tão linda, tão meiga... E agora estava mal por um imbecil como eu. Foi daí então que nasceu minha coragem para fazê-la ir embora. Sim, ela era linda, meiga, não merecia alguém como eu.
- Larissa, vai embora! – Eu gritei, enraivecido. Minha cara, meu olhar deviam estar tão feios, que “até o demônio me imploraria por misericórdia”. Todavia, em momento algum eu estava com raiva dela. Como eu odiaria a única pessoa que fez eu me sentir gente de verdade? Eu sentia raiva de mim mesmo por não ser normal, por não poder tratá-la como devia.

Ela era sensível. Era a única coisa nela que eu considerava um defeito: a sensibilidade. Mas isso nunca fora problema para mim, até aquele dia. É que eu sempre a consolava, e ela voltava a ser estável. Mas aquele dia, por mais que eu quisesse, eu não podia fazer tal ato. E ela chorava, me olhando. Aqueles olhos molhados se fixavam nos meus, fazendo a boca dela ficar sem nada dizer, e mantendo o corpo dela imóvel, como que implorando para que eu não fizesse aquilo. Por um momento, quase conseguiram me fazer ceder. Mas ela não merecia.
- Para de chorar, pelo amor de Deus! – Falei desesperado, colocando a mão em minha testa. Com certeza deixei-a incerta se pedia aquilo por preocupação, ou por vontade mesmo que ela se fosse.
Ela não parava. Não adiantava ser estúpido com ela. Ela não era o tipo de mulher que faz tudo que o homem pede quando ele grita. Me aproximei dela então, dei-lhe um beijo no alto da testa e passei os dedos em seu rosto banhado de lágrimas.
Aí ela me olhou nos olhos, como se fosse dizer algo, e disse:
- Afonso, eu te amo! – E seus olhos ameaçaram chorar novamente.
- Não, não, não. Não chore mais! – Não consegui me conter. Abracei-a forte, mas carinhosamente. – Eu também te amo!
Quando ela acabou de ouvir, e pensou em ficar feliz, achando que eu ia parar com aquilo tudo, eu continuei:
- E é exatamente por eu te amar, que você precisa ir. Eu sei o quão duro está sendo pra você, mas é melhor você sofrer agora. Assim poderá ser feliz depois.
Ela tocou meu rosto:
- Mas como vou ser feliz depois, sem você?
- Você vai ser feliz com a pessoa certa pra você, com a pessoa que pode te dar uma vida à que você é digna de ter.
- Eu te amo, e você me ama! Você é a pessoa certa pra mim.
- Que a gente se ama é certo. Mas uma borboleta não foi criada para ser parceira de um sapo.
- O que quer dizer com isso? – Ela se intrigava, se afastando pequenos centímetros de mim.
- Larissa, você foi a melhor pessoa que eu conheci. A única que fez eu me sentir normal, porque foi a única que me despertou algo de bom. Mas sabe aqueles assassinatos? Algumas amigas suas, amigos, conhecidos e desconhecidos que morreram assassinados? Larissa, você despertou o amor em mim. Mas só fui capaz de amar você até hoje. E aquelas pessoas, fui eu quem matou. Todas!
Ela abriu um pouco a boca, inconformada. Mas então ela foi tomada por uma explosão de desespero em seu interior. O amor, agora misturava-se com angústia e medo. E eu percebi que ela queria fugir de perto de mim.
- Tudo bem, não vou te fazer nada agora. - Tentei acalmá-la -Talvez jamais fizesse algo a você. Mas quero que você vá. Eu não conheço o limite do meu controle, apesar de te amar. E não me ouso arriscar conhecer. Larissa, eu sou o assassino psicopata que os policiais estão procurando.
Ela me olhava, e eu já não sabia que tipos de sentimentos a tomavam naquele momento. Só abri a porta, e dei espaço a ela.
Então ela passou por mim e pela porta sem nada dizer, e pôs-se a correr. Fiquei observando os passos rápidos dela. A menos de um metro de distância da minha casa, ela olhou para trás. O vento vinha contra ela, e quando ela se virou, algumas mechas de seu cabelo bateram-lhe sem doer no rosto. Eu podia ver até alguns fios que voavam com o movimento do vento de outono. Foi então que nos olhamos diretamente nos olhos pela última vez. O olhar dela era expressivo, mas eu não sabia exatamente o que ele queria dizer. Virou-se para frente e continuou a correr. E eu me mantive na porta, observando-a. Estava triste em vê-la partindo. Mas tudo era menos difícil pra mim quando ela não chorava. Eu não sabia o que ela sentia naquela hora, mas o importante é que não chorava. É que eu sofria quando a via sofrendo.

Será que ela contaria tudo sobre mim para a polícia?
Bem, eu não me importava. Por ela, eu aceitaria ser pego pelos tiras e ser jogado e largado no xadrez para o resto da vida. Eu não iria me mudar de casa para que não me descobrissem, não faria nada para impedir que me pegassem algum dia.
Paradoxalmente, parecia que eu era o primeiro homem a ferir os sentimentos de uma mulher, só para protegê-la de mim mesmo. Diante de tudo, e de um jeito inexplicável, eu amava Larissa de verdade e jamais a mataria. Não por minha vontade. Caso um dia eu sentisse essa vontade maldita, seria melhor mesmo que eu fosse preso. Ou então me mataria, só de chegar a sentir vontade de matá-la.
Mas no momento eu não tinha tal desejo. Aliás, em dois meses com ela, nunca tive. Entretanto, para prevenir antes de remediar, lá se ia correndo para longe de mim o único amor da minha vida.
Talvez eu houvesse assassinado os sentimentos dela por mim. O que era um tanto bom. Mas eu, louco assassino psicopata, sempre continuaria sendo morto a cada dia, por não poder ter comigo quem mais amava. Contudo, cada um nasce com tendência a ser alguma coisa. Questiono a troco de que minha tendência foi ser assassino...

Digam o que disser, a vida pode até ser bela. Mas nunca deixará de ser sórdida.

3 comentários:

renatocinema disse...

Assassinos por Natureza. Amor Louco.

Esse conto daria uma bela cena de filme.

Mahh Ruiz disse...

Nos que lindo conto, o mas legal é que posso ver a cena se passar na minha imaginação.
beijos.

Viiviih M. disse...

Muito bem escrito,concordo com renatocinema,daria uma bela cena de filme.