quarta-feira, 1 de setembro de 2010

A grande regência

 












A primeira tem que ser de amor. Porque o amor sempre vem no começo. Pelo menos no começo, no final não posso garantir. O amor rege todas as coisas. Então a primeira postagem será sobre o amor, amor sem fim. João e Maria se amavam muito. O muito que eles se amavam, eu não consigo escrever aqui. Você bem sabe que o amor mal cabe em versos, imagina como é transpor em prosa aquele amor que todo mundo merece ter. Amor que faz tudo ser bonito, tudo ser fantástico, tudo ser assim. Enfim, eles se amavam dessa forma. Espero que você saiba disso, porque eles não sabiam.

Conheceram-se em um supermercado. Poderia ser uma livraria, uma cafeteira, um sex shop ou qualquer lugar onde haja caixas e produtos a serem vendidos. Maria queria saber se o que estava segurando era bom. Perguntou a João, a única pessoa a olhar a mesma prateleira. Como uma boa pessoa educada, João pôs-se a responder e inevitavelmente tiveram de se olhar. Eu achei um erro, eles não, o amor nasce assim. É claro que os dois ficaram tímidos. Quando João gaguejou sete vezes na mesma palavra, Maria, também envergonhada, disse, antes que ele terminasse a frase, que levaria o produto, e foi para o caixa. João continuou ali, praguejando o vento por lhe faltar palavras e por não ter pedido o telefone dela. Ao acabar seu drama interior, João procurou por Maria e a viu saindo da loja. João correu, como a muito tempo não fazia. Atravessou os corredores, largou o que tinha em mãos em qualquer lugar, desviou de uns três ou quatro cidadãos e chegou a tempo de vê-la dentro de um táxi em movimento indo para ele não sabia onde. Sim, tinha muitas coisas que ele não sabia. Não sabia o nome, não sabia a idade, onde trabalhava, com quem dormia. A verdade é que ele sentiu o corpo gelar, injuriou-se e foi em silêncio para casa. O silêncio sempre acompanha a gente nessas horas, não existe companheiro mais digno. Nenhum palavrão que dissesse responderia qual era o nome dela. Nenhuma frase que dissesse, seria o endereço. Naquela noite de Agosto, João dormiu no sofá, afogado em Coca-Cola. Já  Maria achou sua cama fria demais, então dormiu com um travesseiro. O coração deles não dormiu.

Eu não preciso dizer que eles passaram a semana toda imaginando como poderia ter sido. E nem que provavelmente continuaram o resto de suas vidas indo ao mesmo supermercado. Eu sei, eu sei, eu também queria que o final fosse feliz. Poderia ter sido tão lindo! E também não entendo por que a gente faz a mesma coisa. Mas vale pensar que o amor não estava ali à venda, mas sim, para ser encontrado. E encontrá-lo duas vezes perdido na mesma prateleira, do mesmo corredor, no mesmo supermercado é sorte demais para uma só vida. Na verdade não sei o que aconteceu com minhas personagens. Larguei-os nesse momento da história e nunca mais inventei nenhuma outra notícia. Espero que o amor os tenha encontrado. Espero sim.

6 comentários:

Nini C . disse...

As vezes o amor pode parecer tão piegas. Gostei do final assim ;)
O chato é ter que imaginar depois como teria sido, ou e se?...
Beijos.

BlackRabbit disse...

se os dois passaram o resto da vida indo no mesmo supermercado, procurando o amor na mesma prateleira, no mesmo corredor...
acredito q eles tenham se encontrado dnv...
mas nem sempre o encanto do primeiro encontro dá certo...
=p
mesmo assim... belo texto...
\o

Rodolpho Padovani disse...

É, as vezes a gente deixa o amor fugir por não saber como segurá-lo ou quando o reconhecemos já pode ser tarde.
Assim como vc, espero que os dois se encontrem novamente, em outro supermercado, padaria, sei lá, não importa, mas tomara que fiquem juntos...

Abraços!

Começamos bem nossa franquia =)

Inercya disse...

Um final não feliz, mas também não infeliz. Deixou o clichê de lado. Mesmo assim, um dia, algum João e alguma Maria irão se encontrar em algum supermercado e quem sabe?
Belo conto. De verdade.
;*

Fabiana disse...

PUTZ! e se imaginar nesse contexto tantas e tantas vezes, com tantas e tantas pessoas diferentes é de dar um nó na consciência.
cada qual aproveita o que acha estar ao alcance...
muito bom mesmo. ;]

Silene Neves disse...

"O Coração deles não dormiu" Isso é muito, muito lindo!!!

Confesso: me emocionei!

Acho que meu coração vive em insônia meu caro.

Vou seguir-te! Vale a pena!

Beijos da Sil.