Ele se arrasta pela casa tropeçando em livros e discos, pistas deixadas por ela para não deixá-lo completamente.
A sala mal iluminada ainda tem cheiro de lavanda, e ainda há sorrisos grudados nas paredes do quarto. Ele amaldiçoa a memória, e a culpada por tê-la moldado daquele jeito.
Uma música de Radiohead toca em sua mente enquanto a porta fecha e abre lentamente sem saber ao certo como deve ficar. E isso tudo o faz voltar ao dia em que essa mesma porta indecisa foi fechada bruscamente para não mais ter a maçaneta tocada por aquelas mãos finas. E ele chora com o rosto nas sombras, pois as suas lágrimas não são dignas de claridade.
Encara o celular pensando em chamá-la, mas sabe que não o fará, porque sempre foi um covarde. Um barulho quase ínfimo rompe as suas lamúrias, é o celular com o nome dela piscando freneticamente no visor.
Ele limpa a voz para que ela não note os seus recentes soluços.
- Oi Ana. – é o que diz.
- Oi Eduardo, estou ligando para pedir um favor. – sua voz soa naturalmente. Mas ele sabe que ela sempre foi uma boa atriz.
- Qualquer um.
- Vou mandar alguém passar aí mais tarde, você pode entregar os meus livros e discos que ficaram com você? – diz em tom deficiente.
- Tudo bem, mas... Por que você não vem? – sua voz soa baixa. E do outro lado o silêncio se faz denso, cortante, o dilacera a cada segundo que toma pra si.
- Eduardo, eu prefiro assim. – diz enfim. E ele quase pode vê-la contraindo-se de dor.
- Tudo bem então. – diz apoiando-se em sua covardia. Ela faz silêncio e suspira pesado, e a decepção a fere uma vez mais.
- Então... Vou desligar.
- Ana?
- Sim?!
- Você tem sentido a minha falta?
- Tchau Eduardo.
- Ana, espera.
- O que?
- Eu tenho sentido a sua.
- Tudo bem, tchau.
- Você pode vir aqui?
- Não, prefiro mandar alguém que não caia tão facilmente em suas mentiras. – disse desligando o telefone. Chorou ainda o segurando contra si. E ele atirou o seu celular na parede, alguns dos pedaços bateram em seu rosto de volta.
A música de Radiohead volta a tocar, ela instiga as suas lágrimas a caírem conforme as notas vão sendo entoadas. E ele volta às suas lamúrias, deita-se na cama de mãos dadas com a covardia. E então está feito, o retrato perfeito do homem imperfeito que jamais desejou ser.
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